Como Era No Princípio
T. Austin-Sparks
Capítulo 1 _ ‘Como era no princípio...’
Há provavelmente poucos fragmentos da liturgia
mais sujeitos à repetição do que aquela da qual
a primeira parte acima é tomada. Ao mesmo tempo,
pode ser um exemplo da ignorância e da coisa sem
sentido com que muitas frases são constantemente
usadas no cristianismo.
O que é esta ‘coisa’ que era no princípio, é
agora, e será para sempre? A única resposta
verdadeira seria mudar esta ‘coisa’ para ‘Ele’ _
‘Como Ele era _ assim Ele é agora, e será para
sempre’.
Quanto ao resto, há poucas coisas, se de fato
existe alguma, que pode sustentar esta
declaração. É justamente esta mudança desde o
princípio que está causando uma enorme
preocupação e consideração na cristandade, e
especialmente no cristianismo evangélico. O
princípio é a base de uma grande quantidade de
revisão, reconsideração, e esforço de se
recuperar. Pois, quanto ao cristianismo,
simplesmente não é verdade que ‘como era no
princípio, é agora’. Verdade, ‘Jesus é o mesmo
ontem, e hoje, e para sempre’, e as verdades
fundamentais do cristianismo são as mesmas,
porém a maior parte da cristandade está muito
desviada do ‘como era no princípio’.
Este não é um desvio novo. O declínio e o
afastamento começaram antes dos próprios
apóstolos terem terminados os seus cursos, e
suas últimas cartas estão marcadas de
corretivos, recordações e reformas.
Isto tinha a ver não apenas com o caráter, com
as palavras, com os padrões éticos, mas
principalmente com os princípios sobre os quais
o Cristianismo se baseava no início e pelo qual
foi constituído inicialmente. Por isso, é fato
que o princípio espiritual, a própria essência e
natureza do ‘princípio’ mudou, ou se perdeu, o
que explica a mudança deplorável, e o que é
trágico, a perda de impacto, de autoridade e de
responsabilidade.
É para alguns elementos do princípio que iremos
chamar atenção aqui. Quando dizemos ‘elementos’,
deixe-me ser entendido que não queremos
significar o ‘elementar’ no sentido de ser
apenas os princípios rudimentares do
cristianismo. Pelo contrário, usamos a palavra
no sentido de ‘natural’, que carrega consigo
aquilo que o dicionário chama de ‘como os
poderes da natureza, grande, tremendo, não
composto, essencial’.
Não apenas é a primeira característica, mas o
fundamental, inerente, essência concentrada e
potência vital dos princípios espirituais por
trás da expressão aparente. A isto buscaremos
dar atenção, pois estamos convencidos, após um
longo e amplo contato com os cristãos e assuntos
cristãos, que aqui é a chave real da situação.
O erro em muitos esforços para se recuperar o
impacto original, dinâmico, e a autoridade da
primeira metade do primeiro século do
cristianismo está no ponto onde a atenção é
aplicada. Tais coisas como doutrinas, formas,
procedimentos e obras são os pontos de atenção e
debate. Embora essas coisas possam estar
seriamente abertas a questões em vários
sentidos, começar com elas é começar de maneira
errada, e fazer isto é aumentar a confusão ou
chegar a um beco sem saída. O melhor que pode
resultar seria concessão, e concessão é SEMPRE
uma falha em se enfrentar e se lidar com as
causas de forma honestas e corajosas. Vivemos
numa época de concessões em todas as áreas, e
estamos numa época de ‘confusão cada vez maior’.
Nós, cristãos, sabemos que a situação do mundo
nunca irá melhorar até que Jesus volte, pois é
dEle o direito de reinar, porém ele não fará
concessões, não haverá meio termo. Ele irá à
raiz das coisas e lidará com elas lá!
Para qualquer medida de recuperação do poder
perdido, temos que deixar para trás os
resultados e efeitos, seja em doutrina,
procedimento, forma ou obra, e apontar os nossos
dedos nas causas. Houve uma razão e uma causa
para a mudança de impacto sobre o mundo ‘no
princípio’, e, como dissemos, isto repousa em
princípios ou ‘leis’ eternas, celestiais, e
espirituais, os quais estão por dentro e por
trás daquilo que aconteceu. Não está num
conhecimento doutrinário. Isto ainda estava em
processo de se tornar conhecido.
Quando Deus está a caminho de iniciar ou formar,
Ele age primeiro e explica depois. A explicação
é o ‘ensino’, ou ‘doutrina’. Esta é a forma
segura. O ensino é a explicação da experiência.
Ela é apenas a ordem reversa quando o ensino foi
dado e esquecido. Então, como no caso dos
profetas, Deus diz o que Ele está fazendo, ou
irá fazer, e age de acordo. Inicialmente, apenas
um pouco de luz é dada, o suficiente, para Deus
agir. Este método e princípio de Deus podem ser
visto tanto no Velho quanto no Novo Testamento.
É sempre importante ter Deus dando luz sobre o
que Ele fez, de modo que nós chegamos ao
CONHECIMENTO de Seus caminhos, ao invés de
termos uma porção de ensino sem experiência.
Poderíamos nos colocar no caminho dos
tratamentos de Deus, se isto for assim.
O impacto original não estava dentro de uma
forma de procedimento fixo e estabelecido.
Certamente não estava em organizações e
instituições. Essas coisas não existiam.
Repetimos que é tolice querer recuperar o poder
lidando com tais coisas como os efeitos, ao
invés das causas.
Uma ‘palavrinha’ de esclarecimento do
tradutor: Prefiro mudar o título do
livro para ‘COMO ERA NO PRINCÍPIO’, ao
invés de ‘como a coisa era no
princípio’, pelo seguinte motivo: Na
expressão “As It Was in the Beginning”
aparece o pronome ‘IT’, que se refere a
‘coisas’ e ‘animais’. O autor, no texto
traduzido anteriormente, em seu
parágrafo segundo, sugere que se troque
o ‘IT’ pelo ‘HE’, ou seja, ‘coisa’ por
‘ELE’ (fazendo referência à Pessoa de
Cristo). Na língua portuguesa não existe
o pronome neutro ‘IT’, portanto, quando
queremos dizer a expressão: ‘Como a
coisa era no princípio’, apenas dizemos:
‘como era no princípio’. Então, por
questão de ’estética’ achamos melhor
trocar o título do livro para: ’COMO ERA
NO PRINCÍPIO’. (Lendo o livro iremos
perceber a que o autor está se
referindo). Espero ter sido claro. |
Vamos, então, escavar através dos acréscimos da
história e da tradição cristã, até os princípios
fundamentais. O escritor, por um período
aproximado de quarenta anos de contato pessoal
com o cristianismo evangélico em muitas partes
do mundo, tem estado extremamente impressionado
com uma fraqueza ou deficiência básica. Esta
deficiência sem dúvida alguma é indicativo de
todo um conjunto de desvios do que era a
concepção no princípio. Embora a doutrina do
Espírito Santo seja bem conhecida, e uma grande
quantidade de ensino sobre esta doutrina tenha
sido recebida, tanto pessoalmente de
expositores, como através de várias literaturas
sobre a matéria, há muito ainda para se tornar
esta questão real, afinal de contas, multidões _
mesmo a maioria _ dos cristãos conhecem ou não
alguma coisa sobre o Espírito Santo como
presença interior positiva e ativa. Esta questão
é baseada na conduta, em condições, e na
ignorância que visivelmente negam o ensino do
Novo Testamento.
Jesus falou acerca do Espírito Santo, que ‘Ele
estará EM vós’, ‘Ele vos guiará (dentro de vós)
por toda a verdade’, ‘Ele receberá do que é meu
e revelará a vós’, e assim por diante. João,
pelo Espírito Santo, disse (para todos os
cristãos verdadeiros, não apenas aos especiais,
ou líderes ou professores): ‘A Unção que
recebestes Dele está EM vós, e não tendes
necessidade que ninguém vos ensine; mas... a sua
Unção ensinará a vocês todas as coisas...”
(1 Jo 2.7). Embora isto esteja relacionado a
uma questão específica, isto é, o Anticristo,
porém o princípio, segundo Jesus, _ é de
aplicação genérica, e este princípio é o
seguinte: que o Espírito Santo é o árbitro
INTERNO que faz com que os crentes fiquem
conscientes sobre o que é de Deus e o que não é
de Deus. E isto é algo que não é conseqüência de
uma posição avançada na vida espiritual, mas se
refere ao início: ‘O próprio Espírito
testifica com o nosso espírito que somos filhos
de Deus’ (Rm 8.16). A lei do Espírito de
Vida é de aplicação e realidade constante e
crescente como a própria lei do progresso
espiritual. É uma matéria nada mais, nada menos
do que aquele grande fator de compreensão e
inteligência espiritual com que o Novo
Testamento está tão amplamente ocupado.
Vamos dizer logo que este princípio não torna o
cristão independente de instrução através de
ensinadores ungidos, nem cria de maneira alguma
uma posição acima das Escrituras. O Espírito
Santo irá sempre trabalhar de acordo com a
Palavra de Deus, e jamais, em hipótese alguma,
irá nos tornar superiores por causa disso. Nada,
a não ser o extremo risco do engano, poderia
resultar de tal interpretação, ou ‘iluminação’
que dá origem a tal independência ou
superioridade. Contudo, o governo, a iluminação
e o testemunho interior do Espírito Santo é o
fator primário naquilo que ‘era no princípio’.
De fato, isto vai diretamente à raiz da própria
natureza da vida cristã do Novo Testamento; a
essência do ser de um verdadeiro filho de Deus.
Isto tanto determina e define o que podemos
chamar de a ‘espécie’ nova e distinta que os
cristãos foram criados pra ser.
Quando o apóstolo Paulo usa a frase: ‘aquele
que é espiritual’ (1 Co 2.15), ele está
descrevendo a exata diferença de duas categorias
de pessoas. Não apenas ele os está dividindo,
mas os está descrevendo. Uma categoria, ele diz,
é deficiente e defeituosa em certas faculdades,
dotes e qualificações, em relação ao
conhecimento, ao discernimento, ao julgamento e
à compreensão. A outra categoria é distinguida
exatamente por esta habilidade e qualificação.
Porém não é um dom dado posteriormente ao novo
nascimento. Pelo contrário, este dom é herdado
no novo nascimento, e é um componente da nova
vida. É ‘aquele que É espiritual’; aquele
que é certo tipo de ser. Deste ser é dito como
nascido do Espírito, diferindo daquele nascido
da carne, como nascido de Deus, diferindo
daquele nascido do homem. Esta diferença é o
resultado de um advento. É o advento do Espírito
Santo DENTRO do espírito do cristão. Certamente
é razoável que a presença interior dessa pessoa
como ‘o Espírito do Deus Vivo’, Deus
Espírito Santo, signifique mais do que um poder
ou uma inteligência passiva, inativa.
É uma coisa muito gratificante ver algumas
pessoas mudando e ajustando as suas vidas, sua
conduta, sua maneira de falar e vestir, seus
hábitos, suas atitudes, etc., não por que a lei
foi colocada sobre eles por outras pessoas _
seja pregador, ou alguma outra pessoa _ mas
porque o Espírito Santo dentro delas tem falado
e tornado a sua mente conhecida a elas a
respeito de tais assuntos. Há inúmeras matérias
nas Escrituras a respeito disso nas quais há
muitas contradições flagrantes em tantos
cristãos, que bem poderiam nos fazer perguntar:
‘Onde está o Espírito Santo nessas pessoas?’.
Esta é a base de tudo ‘como era no princípio’.
É isto o que veio com o advento do Espírito
Santo. É isto o que foi pretendido e ensinado
para que fosse a própria natureza da nova
dispensação.
Não que ela fosse universalmente e perfeitamente
vivida, mesmo naquela época, mas foi verdade lá,
responsável por grandes e drásticas mudanças de
vida, até mesmo nos próprios apóstolos. Esta,
mais do que o acontecimento exterior, era a
verdadeira natureza e poder dos ‘Atos do
Espírito Santo’; que é um título mais
apropriado para o livro chamado de ‘Atos dos
Apóstolos’.
Este princípio fundamental foi aplicado em toda
direção e conexão, em relação ao próprio Cristo,
a igreja, procedimento, função, obra, e assim
por diante. E é nosso propósito mostrar isto, na
medida em que somos capacitados pelo mesmo
Espírito, pois estamos convencidos de que assim
é ‘como era no início’.
Algumas vezes ouvimos as pessoas dizerem: ‘Oh,
não olhe para trás, para o passado, e para o que
foi. Olhe para as coisas novas de Deus’; e elas
citam Paulo, dizendo: ‘Deixando as coisas para
trás’. Esta é uma conversa muito superficial,
para dizer o mínimo. Pode ser muito perigoso e
enganoso. Estabelecido que não houve nenhum
desvio, abandono, perda, nenhuma renúncia
daquilo que era de Deus, e que os ‘princípios’
fundamentais ainda permanecem com aquilo que
eles significam, há espaço para a exortação:
‘Prossigamos para a perfeição, não lançando de
novo o fundamento...’ (Hb 6.1-6). Porém, o Novo
Testamento, o Senhor Ressuscitado, o Espírito,
têm coisas fortes para falar sobre ‘se
arrepender e praticar as primeiras obras’ (Ap
2.5), e o Senhor tem que tristemente lembrar da
posição da qual o Seu povo se desviou, e
chamá-lo de volta para o princípio.
Vimos que o ‘princípio’ se refere à primeira
parte dos tempos do Novo Testamento, não somente
às últimas partes. Os últimos escritos são
caracterizados por corretivos, recordações e
apelos para uma redescoberta, mostrando que,
muito cedo nos tempos apostólicos, as coisas
começavam a se desviar dos primeiros princípios,
e a mudarem tanto em natureza como na forma.
Essas mudanças serão melhores detalhadas aqui,
na medida em que prosseguirmos.
Para o momento, nos atemos a um fator mais geral
e básico, a partir do qual tudo mais tem sua
origem. Já salientamos que a possessão do
Espírito Santo dentro do espírito do crente
produz uma nova e diferente ‘espécie’ ou
‘gênero’, um novo tipo de pessoa, um tipo
referido pelo apóstolo Paulo como ‘aquele que é
espiritual’, que ele diferencia do ‘homem
natural’ (almático ou psicológico). Este é o
novo homem que é o tema de todo o Novo
Testamento.
Não é simplesmente que um elemento chamado
‘espiritualidade’ foi admitido, mas que um tipo
de homem fundamentalmente diferente nasceu pela
operação do Espírito Santo. Apesar de que o
homem natural ou psicológico permaneça, e
permaneça uma força para ser enfrentado. Por um
lado, o ensino espiritual consiste da crescente
compreensão e entendimento de quão absolutamente
diferente o homem natural é do Espírito de Deus.
As tendências, inclinações, diretivas,
concepções, etc..., do homem natural operam de
forma que são exatamente contrárias daquelas do
Espírito dentro do novo homem. Esta é uma das
coisas mais óbvias nos primeiros capítulos do
livro de Atos. Naqueles capítulos temos a
essência daquilo que entrou no dia de Pentecoste
como a própria natureza e princípio da nova
dispensação. É um ensino observar a maneira que
religiosos devotos e homens completamente
sinceros estavam sendo ensinados em relação a
esta diferença fundamental entre o homem
natural, ainda que religioso, e aquele ‘homem
espiritual’. O fator inclusivo e abrangente era
a absoluta Soberania do Espírito Santo como o
executor do Ressurreto e exaltado Senhor Jesus.
Um legado muito forte da mentalidade e do
sistema do Novo Testamento estava presente
naqueles primeiros homens responsáveis tais como
Pedro, Tiago e João. Basicamente por causa deste
único fator, esta mentalidade, o advento do
Espírito tinha que ser ‘como o som de um
poderoso e violento vento’. Não apenas um vento,
mas a força. A única necessidade inicial era que
aquelas pessoas compreendessem que as coisas
foram tiradas completa e absolutamente de suas
mãos; que fossem lá o que suas mãos pudessem
implicar _ mentalidade, predisposição,
raciocínio, tradição, concepção, interpretação,
etc. _ o Espírito de Deus estava acima daquilo,
tanto como contrário aquilo, ou como tendo um
significado que eles jamais tinham visto. Este é
o primeiro fator no significado prático de ‘Como
era no princípio’.
Poderia parecer que, embora aquelas pessoas
compreendessem a força do acontecimento, eles
ainda tinham que aprender o seu significado,
pois, a partir dali, o conflito entre o homem
natural e o homem espiritual, dentro deles, era
o caminho do ensino deles. A transição do
Judaísmo para a plena implicação da nova
dispensação do Espírito foi repleta de algumas
batalhas e revoluções duras e dolorosas.
Repetidamente vemos uma crise aparecendo sobre
esta questão e a balança pendendo entre a antiga
ordem e a nova. Não, que seja enfatizado, não
entre o mundo e o homem perverso e o
cristianismo (este foi um outro aspecto), mas
entre a herança, a instrução e a tradição de um
homem bom e devoto e um significado e uma
disposição celestial completamente nova.
Vamos repetir: as ações drásticas do céu, como
no caso do Pentecostes em geral, e de Pedro, e
de Saulo de Tarsus em particular, demonstraram
que a nova ordem era ‘nova’ e não um
reaproveitamento de alguma coisa. Era um
Senhorio, uma dominação!
Pedro, baseado em sua interpretação das
Escrituras do Velho Testamento sobre comer
coisas impuras, pôde protestar contra o Senhor,
porém todo o apostolado de Pedro dependeria de
sua submissão em permitir que o Senhor lhe
fizesse conhecer melhor. Foi uma crise na qual
Pedro estava no limiar de uma descoberta que
absolutamente o espantou, e o deixou sem
qualquer explicação, exceto: ‘Deus o fez’, e
‘quem era eu para me opor a Deus?’ O princípio
aqui contido é o campo de batalha da questão
contínua de mais ou menos poder e plenitude
espiritual.
O homem natural, psicológico, é positivamente
incorrigível e inveterado na questão de
cristalizar, fixar, legalizar e colocar numa
forma final. Ele simplesmente deve sistematizar
e finalizar. Embora ele possa não saber o que
ele quer significar, ele cantará com gosto:
‘Como foi no princípio, é agora, e sempre será’,
porque ele está amarrado a fórmulas. Ele se move
quase mecanicamente no sentido de ‘desenhar
algo’ para colocá-lo numa moldura, e fazer um
compartimento para aquilo. Nunca o Espírito
Santo fez alguma coisa, mas os homens
subseqüentemente tomaram as características de
algo e daquilo compilaram um manual, ou um livro
texto, e buscaram impô-lo ao Espírito Santo e à
igreja como obrigatório e essencial. O princípio
mostra que o Espírito Santo não aceitará nada
disso. Ele exige para Si absoluta liberdade de
ação e método. Do ponto de vista do cristianismo
histórico e organizado é quase impossível
perceber que há certas coisas que o cristianismo
não era no início.
Por exemplo, o cristianismo NÃO ERA uma nova
religião. O cristianismo não foi colocado contra
ou lado a lado com outras ‘religiões’, de modo
que pudesse ser incluído nas ‘Religiões
Comparativas’. Embora alguns dos próprios
apóstolos foram tardios em perceberem que o
judaísmo estava ultrapassado e tinha sido posto
de lado por Cristo, ‘o estoque todo’
(expressão); e somente Estevão, e talvez alguns
poucos com ele, tinham visto a completa ruptura,
pelo qual ele teve que pagar com a própria vida,
contudo este fato tinha que ser encarado
firmemente, e sua aceitação _ plena ou
reservadamente _ determinou o grau da medida
espiritual deles. Paulo foi supremamente
encarregado por esta questão. O pensamento, o
raciocínio e a maneira com que eles lidavam com
os seus preconceitos tiveram que ser tratado
depois de experiências embaraçosas. Eles
começaram com ‘atos’, não com uma nova
religião.
Além do que, o cristianismo não era um novo
‘ensinamento’. Não há nada em todo o registro
sobre o qual construir uma teoria ou afirmação
de que os apóstolos tornaram ‘O Ensino de Jesus’
um sistema estereotipado. Eles não saíram
propagando no mundo pagão, bárbaro ou judaico
novas doutrinas ou um novo sistema de verdades.
Explicações, que se tornaram o ensino ou
doutrina da igreja, estavam reservadas para
aqueles que respondiam em fé à declaração de
certos fatos fundamentais em relação à Pessoa de
Jesus Cristo, e essas eram poucas. O máximo que
eles faziam era sustentar e confirmar os seus
testemunhos em relação a Jesus a partir das
Escrituras.
Repetindo: O cristianismo não foi originalmente
imaginado como um novo movimento. Nenhum plano
de campanha foi colocado. Não houve política. A
organização estava quase que inteiramente
ausente. O pequeno grau de organização foi
subseqüentemente imposto sobre eles por causa do
embaraço da própria vida espiritual. Não existia
uma campanha planejada. Estabelecer, formar,
lançar, ou trazer à existência, ou fundar uma
nova sociedade, seita ou comunidade, não passava
pela mente deles. As pessoas de fora colocavam
os rótulos, talvez por causa da distinção
espiritual dos crentes, porém eles nunca
adotaram um título especial para eles mesmos. A
característica que realmente distinguia não era
o nome de um movimento, mas a presença de um
mistério a todo mundo exterior. Toda tentativa
de explicá-los por meio de um rótulo, tais como
‘Cristãos’, ‘O Caminho’, ‘Seita’, apenas
demonstrou uma falta de entendimento. Não existe
uma fórmula para explicar a vida, seja natural
ou divina; e, se houvesse, seria como tentar
colocar o Oceano Pacífico dentro de uma garrafa.
Prejuízo para a garrafa, como Jesus disse a
respeito do novo vinho e do odre velho. A ‘lei
do Espírito de Vida em Cristo Jesus’ que era
responsável pela experiência, que explicava, que
ensinava, que energizava a ação, e produzia a
‘forma’ _ a forma orgânica no princípio.
Aqui, então, nos ocupamos com o geral, com o
fator inclusivo do ‘princípio’, esta é a
absoluta e soberana liberdade, governo, senhorio
e direção do Espírito do Cristo entronizado no
céu. Isto exigiu uma superação e subjugação de
todas as afirmativas do homem natural. É uma
crise e, também, um progresso. Como implicamos,
isto teve um efeito tanto em relação ao
relacionamento com o mundo como os
desenvolvimentos dentro da igreja. O primeiro
desses dois aspectos iremos nos ater no próximo
capítulo.
Capítulo 2 - A Igreja e o Mundo
Em nossa busca pelos segredos do poder na igreja
‘Como Era No Princípio’ _ isto é, nos anos
imediatamente subseqüentes ao grande Pentecoste
_ é inevitável que cheguemos à relação da igreja
com o mundo. Esta inevitabilidade é colocada
sobre nós tanto por seu espírito e conduta, como
pelo grande número de referências ao mundo nos
escritos do Novo Testamento. O próprio Senhor
Jesus é mencionado como tendo algumas coisas
muito fortes para dizer sobre o mundo. João, em
seu evangelho, usa esta palavra setenta e sete
vezes. Somente no capítulo dezessete ela ocorre
quinze vezes. Em suas cartas ela é usada vinte e
uma vezes. Em Coríntios ela é encontrada vinte e
duas vezes, e ela é referida em quase todas as
demais cartas.
A respeito do mundo é dito:
1. Que ele é algo que Cristo teve que vencer, e
que Ele disse que venceu.
2. Que em sua totalidade ele jaz no maligno, e
que tem um príncipe.
3. Que ele é hostil e inimigo de Deus, e que ser
seu amigo é ser inimigo de Deus.
4. Que ele é algo do qual os cristãos foram
tirados, e que foi intercedido para que eles,
embora estejam no mundo, possam ser guardados
dele.
5. Que ele está debaixo de condenação e será
destruído.
Muitas outras coisas são ditas sobre ele, porém
nós não nos propomos a entrar numa análise da
palavra em si, ou a diferença de palavras gregas
traduzidas para esta única palavra ‘mundo’.
Porém, alguns podem talvez citar João 3.16,
querendo contrariar o que foi falado acima:
‘Deus amou o mundo...’ Esta grande Escritura
indica o real significado do que nós vamos
dizer. Na verdade não há contradição. A fim de
entender o contraste, temos que fazer a
pergunta: O que é esta coisa que é tão
destituída do favor de Deus, e que, por outro
lado, é tão amada por Deus?
Em relação à primeira pergunta pode ser dito
logo que, neste sentido de desfavor, ‘mundo’ não
significa a moldura, a esfera, o material e a
estrutura geográfica. Nem significa
essencialmente as pessoas dentro desta
estrutura. Deus não odeia a humanidade! ‘Mundo’,
portanto, deve significar outra coisa, e nós,
talvez, podemos indicar isto por meio de certos
termos como: uma natureza, uma disposição, uma
mentalidade, um sistema, uma constituição, um
caminho! É em tudo isto que aquilo que é oposto,
hostil, contrário a Deus é inerente.
O ‘mundo’ neste sentido é rejeitado por Deus por
causa de Sua própria natureza e constituição. É
aqui que repousa toda esta questão de
mundanismo. Esta questão tem sofrido
lamentavelmente de má interpretação, e tem feito
com que muitas pessoas sejam colocadas numa
posição falsa.
Por exemplo, mundanismo tem sido transformado
numa questão do lugar aonde as pessoas vão
(teatros, cinemas, danças, etc.), ou da forma
como as pessoas se vestem e se comportam, ou
falam. Tem sido dito que, para se tornar um
cristão, tais coisas devem ser abandonadas e
outras coisas devem ocupar o lugar delas.
Folhetos têm sido escritos sobre: Deve um
cristão ir ao teatro? – Fumar? Beber bebida
alcoólica? Usar maquiagem? E assim por diante.
Isto é não compreender o principal, o que pode
levar ao legalismo ou ao judaísmo. Realmente, em
tudo isso, o que não é compreendido é nada menos
do que o novo nascimento em si, que, se genuíno,
_ resultando no Espírito Santo morando em nosso
interior e na vida de Deus _ irá responder todas
as questões à partir DO INTERIOR.
Vamos olhar mais de perto nesse termo ‘mundo’ à
luz da Bíblia.
1. O Mundo é uma Natureza
Como
observamos, o mundo é hostil a Deus, e Deus a
ele, se ele é algo a ser “vencido”, e do qual o
cristão deve se afastar, se a amizade com ele
constitui em “inimizade contra Deus”, então deve
haver algo muito maligno sobre ele, e que é mais
maligno do que o próprio Satanás? A Bíblia
representa Satanás como tendo se tornado ‘o
príncipe deste mundo’, e é seu ‘deus’ pelo
consentimento e conquista do homem, a quem a
terra criada estava entregue em confiança.
Mas deixe ficar claramente entendido que esta
mudança de governo não foi nenhuma coisa
‘oficial’ e formal, de modo que Satanás passou a
governar meramente de uma posição externa. Ele
capturou a mente, o coração e a vontade, e
inoculou na alma do homem a sua própria
natureza. A natureza do homem foi mudada. O que
é esta natureza?
Abrangentemente ela é mostrada como estando em
rivalidade com Deus, isto é:
(a). Para tomar o lugar de Deus.
(b). Para tomar o direito de Deus e não permitir
que Deus seja tudo.
(c). Para ser independente de Deus e
auto-suficiente, saber mais, capaz de fazer
melhor, ou fazer sem Deus.
(d). Para ser possuído de poder, a fim de
controlar, dominar, ser superior; uma revolta
contra a sujeição e subordinação.
Esta é a natureza com que, num grau maior ou
menor, a humanidade tem sido impregnada. O
coração de toda esta questão é ‘independência’,
contrário de dependência de Deus. Como isto
ocorre?
(a). Ocupar-se muito mais com o que é material e
temporal do que com o espiritual.
Para Deus todas as coisas são vistas do ponto de
vista do valor espiritual. Esta é a Sua própria
natureza. Deus é Espírito, não impessoal, mas um
Espírito pessoal. A importância das pessoas na
Bíblia é a medida do efeito e do fruto
espiritual de suas vidas e serviço.
Satanás irá absorver e obcecar com o material e
temporal, a fim de roubar o espiritual, ou
reprimi-lo.
(b). Ocupar-se somente com o presente e ofuscar
o eterno.
O que temos e podemos obter agora é a
preocupação mais importante. Esta vida é tudo!
Isto é o real; o eterno é irreal para o homem
natural.
Este é o grande ponto onde Satanás tentou a
Cristo e Lhe ofereceu o mundo. Neste ponto Jesus
venceu o mundo! No mundo o que se vê é o que
importa; o sentido natural da percepção e da
avaliação predomina completamente. O padrão de
sucesso é aquele que pode ser mostrado.
De muitas outras maneiras, a natureza deste
mundo está em contraste com a natureza de Deus;
os seus padrões, seus pontos de vista, seus
valores, seus objetivos, seus pensamentos, seus
caminhos, seu espírito. Um dos maiores aspectos
no ensino espiritual do cristão é aquele de
aprender quão completamente diferente são os
pensamentos, medida de valores e os caminhos de
Deus em relação aos nossos.
2. O Mundo é uma Prisão
O guardião desta prisão é o próprio Satanás.
A Bíblia revela as almas dos homens como estando
num cativeiro, numa escravidão, em grilhões,
numa prisão, no poder de Satanás. Ela revela
Cristo como o Redentor ungido vindo a este mundo
para ‘proclamar a liberdade aos cativos, e a
abertura da prisão aos encarcerados’. Ele é mais
forte do que o homem que vigia a sua casa!
A libertação de uma alma do mundo implica em
conflitos muito intensos, e, após a libertação,
é uma contínua batalha para se mantê-la livre
das influências do mundo, do seu poder e de sua
atração.
3. O Mundo é Mentiroso
Como o homem no princípio caiu na armadilha da
mentira, assim ele permanece vítima do que é
falso. Quanto mais uma pessoa tem deste mundo,
maior a desilusão no final. Os prazeres do mundo
são uma corrente enganosa que irá fracassar
finalmente. Suas riquezas não trazem satisfação
ao coração, e a alma sai tão nua como quando
entrou.
Jesus disse que ganhar o mundo inteiro em troca
da alma não é um bom negócio. A sutileza pela
qual o homem foi inicialmente capturado estava
no fato de que a VERDADE quanto ao resultado
final não estava revelada, mas escondida. Jesus
deixou as pessoas de Seu tempo sem qualquer
dúvida de que elas eram cegas, e demonstrou isso
por meio de milagres, isto é, por meio de atos
que somente Deus poderia fazer.
Há graus de cegueira. Há a cegueira natural, que
é universal, mas que pode ser remediada pela
graça e poder de Deus. E há a dupla cegueira do
preconceito e do orgulho adicionados à natureza,
que é fatal. Tal era a cegueira da classe
religiosa dominante do tempo de Cristo, e isto
custou a esses religiosos toda a esperança.
Tudo o que temos dito e tudo que isto implica
podem ser provados pela história, e para os
cristãos por meio da experiência. Eles pegaram o
elemento comercial do mundo e o ligaram às
coisas celestiais. Isto é mais tarde declarado
como sendo algo colocado no coração por Satanás.
O resultado foi desastroso para eles,
‘No princípio’ a igreja sabia de tudo isto,
permanecia nesta verdade e a ensinava. Além do
mais, o Espírito Santo tornou isto muito real.
Naqueles dias uma cumplicidade com o mundo era
desastrosa. Quando aqueles que tinham bens
negociáveis e propriedades abriram mão deles
para o proveito do evangelho, havia dois que
tiraram vantagem da situação, a fim de obter
vantagem para eles. E o imediato julgamento
lançou para sempre o princípio de que
mercantilismo em coisas divinas é fatal.
Foi por causa da invasão permitida do mundo
dentro das igrejas que o julgamento deles é
efetuado, como registrado em Apocalipse, e em
alguns casos, o candelabro foi removido. A
grande decepção que está custando à igreja tanto
poder é que, a fim de influenciar o mundo, é
necessário ser um com ele, é necessário descer
ao seu nível; para empregar os seus métodos,
para usar os seus meios e para remover toda
distinção entre a igreja e o mundo. A verdade é
que o poder da igreja sobre o mundo é
proporcional à sua separação dele. A questão da
atração é para ser respondida ao longo da linha
de uma igreja perfeitamente contente e
satisfeita sem qualquer dos brinquedos do mundo.
Isto temos visto demonstrado. Há um magnetismo
sobre a alegria e regozijo de cristãos
completamente engajados e consagrados que tornam
vão os métodos do mundo.
Assim era ‘no princípio’, apesar da perseguição,
do ostracismo, e da grande adversidade. O
segredo do poder inicial e do crescimento da
igreja era a grandeza do novo mundo que tinha
sido aberto em Cristo, e a entrada da igreja
nele. Cristo os preenchia completamente, e eles
não necessitavam de qualquer acréscimo. O que
isto significava era a grandeza de Cristo e a
compreensão que eles tinham dEle.
A independência deles do mundo era o poder que
eles tinham sobre o mundo. A suficiência de
Cristo propiciou aquela independência. Isto
intrigou o mundo, levou-o a inquirir, a
investigar, e a ansiar, mesmo que isto
provocasse o príncipe deste mundo à amarga
inveja e antagonismo.
A igreja pode ter que caminhar um bom caminho
para trás, a fim de recuperar o seu poder e
influência, porém, não há alternativa, e o mundo
irá experimentar a sua queda, desilusão e
vergonha.
Capítulo 3 - Igrejas e Obreiros
Temos dado grande ênfase sobre o fato de que, no
princípio, tudo estava debaixo do governo do
Espírito Santo, o qual tinha assumido a custódia
de todo o propósito de Deus, e era o Seu
curador. Como no caso do tabernáculo do Velho
Testamento, o modelo completo foi concebido no
céu até o último detalhe, e mostrado. Então,
Bezaleel e Aholiab foram cheios do Espírito de
Deus para toda arte de ofício. Absolutamente
nada foi deixado para a concepção do homem, e
porque as concepções eternas, espirituais e
divinas estavam por trás de cada fragmento, Deus
foi meticulosamente detalhista.
Assim foi na primeira fase de coisas no
princípio do novo Israel. O homem possui uma
grande propensão para colocar as suas mãos nas
coisas, e nada é tão sagrado para escapar disso.
A grande precaução tomada por Deus quando Adão
desencadeou este tipo de coisa foi: ‘Para que
ele não estenda as suas mãos... ’ Quando
isto foi feito, como nos exemplos de Nadab e
Abiú, Uzias, Ananias e Safira, etc., o Senhor
mostrou a Sua desaprovação por meio de um
julgamento rápido. A mão do homem é sempre
possessiva, controladora e organizadora. Seu
método é trazer as coisas dentro dos limites de
sua própria mente e juízo. Não há acordo entre
as mãos do Espírito Santo e as mãos do homem, e
qualquer tentativa da parte do homem de
conciliar irão resultar em conseqüências
desastrosas mais cedo ou mais tarde.
Há uma necessidade clamorosa por uma renovação
de nossa mentalidade em relação aquilo que
chamamos procedimento neotestamentário. O ponto
inicial terá que ser na encruzilhada entre
causas e efeitos, isto é, como e por que as
coisas começaram, e as coisas em si. Nós
começamos do lado errado, no lugar onde as
coisas estão em existência, e tomamos as coisas
como um modelo, um projeto, um livro texto, e
passamos a imitar, a copiar, a reproduzir.
Assim, reduzimos o Novo Testamento em um manual
de organização. Fazendo assim, desprezamos o
fato fundamental, elementar, e vital que aquilo
que temos no Novo Testamento nunca foi desta
maneira. Seja lá o que exista no Novo Testamento
que é chamado de uma ‘ordem’ era um
assunto normal, natural, espontâneo, de um tipo
de vida que tinha sido miraculosamente concedida
pela ação direta do mesmo Espírito quando tornou
possível a concepção de Jesus no ventre de
Maria: ‘Gerado, não criado’. Foi o
crescimento e a formação de um organismo: ‘Não
do sangue, nem da vontade da carne, nem da
vontade do homem, mas de Deus’. (Jo. 1.13).
Isto foi tão verdadeiro da parte inteira quanto
o foi das partes individuais.
Vamos tomar:
O Caso das Igrejas
A idéia mais genérica é que os apóstolos, Paulo
em particular, criam que eles foram chamados
para ir e formar igrejas por todo o mundo, que
quando eles entravam numa província, ou numa
cidade, o pensamento deles era o de formar lá
uma igreja local. Iremos procurar em vão por
alguma ordem do Senhor, ou intimação vinda dos
apóstolos de que este era o objetivo deles. O
que eles sabiam ser seu negócio era trazer
Cristo por onde quer que eles fossem. Se Cristo
fosse rejeitado, não havia igreja. Se Cristo
fosse aceito, aquelas pessoas que O aceitaram se
tornavam um instrumento de Cristo naquele lugar.
A única concepção de igreja em todo lugar não é
uma representação da religião cristã, mas uma
corporificação de Cristo. Onde quer que isso
ocorra, mesmo que sejam duas ou três pessoas
reunidas em Seu nome, lá Jesus está. É a
presença de Cristo que constitui uma igreja, e é
o aumento e a conformidade a Cristo que é o
crescimento de uma igreja. No livro de
Apocalipse, o Senhor não hesita em falar da
remoção de um castiçal, caso cesse a sua função
essencial, embora muita da forma e da atividade
cristã ainda possa estar presente. A função
essencial e o critério final é a presença de
Cristo. A presença do Senhor sempre foi o fator
determinante nos valores eternos. É a função
suprema de o Espírito Santo trazer Cristo para
dentro de todas as coisas, e todas as coisas
para dentro de Cristo.
Igrejas, como tais, são apenas meios, e, como
coisas terrenas, elas passarão com o tempo. O
que é de Cristo dentro e através dos meios será
reunido numa forma especial dentro da grande
igreja universal que Cristo irá apresentar a Si
mesmo _ ‘uma igreja gloriosa’. Nós não
estamos aqui tratando com o organismo pleno que
sai da semente da vida _ a lavoura de Cristo _
mas apenas com ‘como era no princípio’.
Naturalmente, um desafio está envolvido: Como
isto e aquilo vêm à existência?
O princípio que era pra ser estendido para o
mundo inteiro estava inerente na escolha e no
envio por Cristo dos ‘setenta’. Eles
foram enviados a todo lugar ‘aonde Ele próprio
viria’. Uma igreja local, então, não é em
primeiro lugar algo constituído ou formado
conforme um modelo ou procedimento, mas pela
presença de Cristo em duas ou mais pessoas
naquele lugar. Essas pessoas ‘batizadas em um só
Espírito em um só corpo’ são, em efeito, Cristo
naquela localidade, tomando posse da terra como
um testemunho de Seus direitos, e espalhando ‘o
bom perfume de Cristo em todos os lugares’.
Falhar nisto, com relação à sua verdadeira
função, o organismo está morto.
Continue com a forma se você quiser, porém a
‘igreja’, como tal, não é mais sagrada aos olhos
do Senhor do que o tabernáculo em Siló, ou o
templo em Jerusalém, uma vez que a glória tinha
desaparecido, isto é, a presença do Senhor.
Os Obreiros
O princípio ao qual temos nos referido acima é
o mesmo em relação a toda pessoa que tem
qualquer posição de responsabilidade na obra do
Senhor. É um grito distante dos métodos modernos
em comparação aos do princípio. A escolha
através de voto popular, a escolha de pessoas
‘habilitadas’ para o serviço, a influência de
títulos, de diplomas, de homens com visão de
negócio, de sucesso no mundo, de dinheiro,
‘interesse na obra de Cristo’, a escolha de
‘neófitos’, e dar ou permitir reconhecimento
público a tais coisas é um sistema que não tinha
nenhum lugar no princípio. Isto está repleto de
problemas que aparecerão mais cedo ou mais
tarde, e é algo perigoso para as pessoas
envolvidas.
Uma questão simples e prática surgiu bem no
princípio. Foi apenas uma questão de ver que
certas viúvas estavam sendo desprezadas quanto
às suas necessidades básicas diárias, e a
ministração justa do dinheiro disponível.
Poderia ser pensado que qualquer bom homem, ou
homens, com um pouco de habilidade para negócio,
poderia resolver aquela situação, mas não foi
assim no princípio. A prescrição era: ‘...homens
de boa reputação, cheios do Espírito e de
sabedoria’. ‘E eles escolheram Estevão,
um homem cheio de fé e do Espírito Santo, e
Filipe, e Prochorus, e Nicanor, e Timon, e
Parmenas, e Nicolas, um prosélito de Antioquia:
a quem eles colocaram diante dos apóstolos, e
eles oraram e lhes impuseram as mãos’. (At.
6).
O assunto foi conduzido por meio de cuidado
escrupuloso, e o requisito essencial era ser ‘cheio
do Espírito Santo’, para que todos pudessem
ver. Nesta fase mais elementar de procedimento o
imperativo era homens espirituais,
reconhecidos por todos como tais. O ‘ritual’ não
os tornava espirituais. Eles já eram espirituais
antes que as coisas mais elementares lhes fossem
confiadas. Evidentemente eles tinham sido
provados na igreja e foram aprovados antes que
fossem ‘ungidos’. Se isto era assim no caso das
responsabilidades elementares, quanto mais seria
isto aplicado à grande responsabilidade dos
anciãos e dos que presidiam.
Antes dos apóstolos terem terminado os seus
ministérios, as coisas começavam a mudar na
ordem da igreja. Sinais de um eclisiasticismo
insipiente, como conhecemos hoje, estavam
aparecendo. É desprezado que quando Paulo
escreveu suas cartas _ a Timóteo _ e disse que
ele escreveu para que os ‘homens pudessem
saber como deveriam se comportar na casa de Deus’,
que Paulo estava escrevendo a fim de corrigir o
comportamento errado. Aquela má conduta estava
associada principalmente aos que estavam em
posição de responsabilidade, os anciãos. O
corretivo de Paulo era o reconhecimento de que
anciãos não são apenas cargos eclesiáticos, mas
são essencialmente homens espirituais;
homens de medidas espirituais, e não
neófitos. Eles são anciãos em caráter, em
qualificações e dons espirituais antes de terem
o título de ancião. O título jamais transforma
um homem num ancião. Se ele já não for um
ancião, nenhum título jamais o irá transformar
em um! Tanto na igreja, como em homens
responsáveis, é a presença e a medida de Cristo
que determina tudo.
Nós não fizemos mais do que apontar um princípio
vital. Vital no sentido de que ele irá
determinar a vida, o curso e o destino de tudo
que levar o nome do Senhor.
Capítulo 4 - Cristo e Sua Igreja em Oculto
‘...o mundo não nos conhece,
porque não conheceu a Ele’ (1 Jo. 3.1).
Em nossa busca pelas diferenças
entre as coisas hoje e como elas eram nos
primeiros anos do cristianismo, vamos logo
deixar claro que isto não é nenhum desejo inútil
de fazer comparações e simplesmente deixá-las
lá. É sempre uma coisa muito fácil e geralmente
infrutífera encontrar e fazer comparações, e não
é muito inteligente fazer isto.
Em nossa busca há apenas um
objetivo dominante: é descobrirmos se as
diferenças representam um ganho ou uma perda
real.
Podemos achar que somos levados a
uma conclusão mais do que genérica em relação ao
cristianismo como um todo. A probabilidade é que
problemas espirituais na vida do cristão
individual podem ter luz lançada sobre eles.
Porém devemos começar com o princípio
fundamental e com a diferença maior. Esta
diferença é fácil de ver, e é muito grande de
fato.
A citação da carta de João (ao
longo da qual muito mais poderia ser explorada)
contém uma afirmação categórica: ‘o mundo não
nos conhece’, e isto está ligado a uma
desaprovação e uma interpretação mais ampla,
mais drástica, mais ampla: ‘porque não
conheceu a Ele’.
Esta é uma simples e óbvia
afirmação do fato: o fato de que tanto o Filho
de Deus e a igreja de Deus poderiam estar aqui
neste mundo em contato bem próximo com as
pessoas, com todas as maravilhas e milagres do
Divino propósito, e o mundo continuar num estado
de completa incapacidade para identificá-los _ ‘não
os conhece’.
Isto não significa que o mundo
estava inconsciente de sua presença. Muito pelo
contrário! O mundo estava muito longe de ser
capaz de ignorá-los. Eles tinham que
considerá-los. Porém, quanto a sua verdadeira
identidade e significância, o mundo não podia
compreender. De tempos em tempos, o mundo, que
precisa reduzir tudo a uma fórmula, a uma
etiqueta, a um nome, fez uma tentativa de
encerrar esta inescrutabilidade numa palavra, ou
frase, ou epíteto. Ele cunhou um termo e
apelidou-os de ‘cristãos’, ou pessoas ‘do
caminho’, ou uma ‘seita’. Esta é a
maneira de agir do mundo. Ele precisa reduzir o
infinito, o eterno, à medida de sua própria
mente.
Mas a pergunta que é vital para
nós é se esta posição secreta foi ganho ou
perda. Pedimos licença para afirmar sinceramente
que foi um ganho indescritível, tanto no caso de
Jesus como de Sua Igreja, de que a real
natureza, virtude, poder e significância de sua
presença neste mundo estivesse exatamente no
fato de que havia um segredo que estava além da
compreensão natural. Embora eles desejassem que
os demais homens pudessem entrar pelo mesmo
caminho que iria tornar este segredo real também
para eles, era apenas no conhecimento de que um
milagre divino estava no coração daquela
experiência que a força de Cristo e da igreja
repousava. O mistério intrigava, confundia,
frustrava, enfurecia o mundo, ou deixava-o
pensativo. Carne e sangue não podiam revelar
aquele mistério, somente o Deus Todo Poderoso! ‘O
mundo não nos conheceu’, isto não era
nenhuma queixa, nem lamentação de derrota, e nem
uma confissão de que algo faltava neles. Eles
sentiam pelo mundo, não por eles mesmos.
O poder deles repousava nesta
diferença fundamental. Porém, o tempo chegou,
muito cedo, quando esta distinção começou a se
render, em troca por uma ‘reputação’ com o
mundo, e isto dá força à nossa pergunta: A
igreja ou o cristianismo ganhou realmente com
esta troca? O cristianismo agora recorre a cada
meio concebível por meio do qual ele possa
ganhar posição, reconhecimento e prestígio, e na
qual o mundo possa facilmente compreendê-la.
Para o seu próprio sucesso ela precisa ter
nomes, títulos, designações, honras, etc. Se os
cristãos não se ‘conformarem’, não
‘pertencerem’, não tomarem um nome, e não se
explicarem a si mesmos, eles são suspeitos,
intrusos, e sem ‘reputação’; não importa quais
possam ser os seus valores espirituais. ‘Seita’
tornou-se um epíteto, uma expressão de escárnio,
como nos tempos apostólicos. Nesta linha o
cristianismo se expandiu, tornou-se grande,
porém, a pergunta é premente em muitas honestas
e sérias mentes quanto a se o valor intrínseco
poderá ser comparado com aquele do princípio.
Não é impressionante ver como,
embora aquilo que teve um início forte,
profundo, rico e eficiente tenha sido ‘aceito’
pelo mundo, especialmente o mundo religioso,
marcas de perda espiritual se mostram? De
quantos ministérios e instrumentos iniciados em
Deus estão nesta situação. De algo do céu,
contendo uma profunda e valiosa história
espiritual, e possuindo o dinamismo e o impacto
da presença divina, ao seu posterior
desenvolvimento numa ‘instituição’ que está de
bem com os homens, com toda a sua grandiosidade,
tornou-se uma mera sombra de sua origem, em
relação ao seu profundo e espiritual poder. Há
hoje pouco, ou nenhum ‘mistério’ sobre ela. Não
possui nada de inescrutável e inexplicável nela.
Ela pode ser atribuída principalmente à
habilidade humana.
Vamos nos apressar em inserir uma
palavra de caráter protetora. Nós não estamos
dizendo que é uma coisa errada para os cristãos,
como pessoas privadas, terem ganho, honras,
diplomas, títulos, ou designações. Estamos
cientes de um movimento ultra-exclusivista no
qual, para se ter comunhão, reconhecimento, e
participação na Mesa do Senhor, é exigido que se
repudie e se renuncie todos os diplomas
profissionais, acadêmicos, e outros. Nós não
estamos definitivamente apoiando isto. Em suas
áreas essas coisas têm o seu lugar. O que
estamos dizendo é que, se o cristianismo procura
fazer dessas coisas a base de sua força, de seu
apelo, ou de seu status, ele irá se desviar e
conseqüentemente irá sofrer a perda do poder
espiritual. ‘O mundo não nos conhece’, e
qualquer tentativa de colocar valor humano no
lugar daquele segredo espiritual se mostrará
desastroso. Quando o termo ‘instituição’ começa
a aparecer largamente no vocabulário cristão,
isto pode significar que uma mudança aconteceu
que não foi para melhor.
O desafio a muitos corações é no
sentido de saber se eles estão preparados para
serem mal compreendidos, não reconhecidos, não
valorizados e não aplaudidos neste mundo, e
viverem somente para os valores eternos. Tem
sido dito do apóstolo Paulo que ‘ele vivia
somente com os valores eternos em vista’. Ele
estava correto?
Um apóstolo diz: ‘O mundo não
nos conhece... não conheceu a Ele’. Um outro
diz: ‘A ardente expectação da criação aguarda
pela manifestação dos filhos de Deus’ (Rm
8.19). Haverá algumas surpresas quando isto
acontecer _ em ambos os sentidos!
Somente o Espírito do Filho, e
aqueles que têm esse Espírito, conhecem os
filhos de Deus. Deus os escondeu do mundo. É
doloroso não ser reconhecido, porque isto é
contrário à nossa natureza _ como é.
O mundo precisa ver os
embelezamentos, as honras, as vestimentas, os
títulos, a fim de levar em conta. No princípio
não era assim. ‘Eles tomaram conhecimento de que
aquelas pessoas tinham estado com Jesus’. Há uma
maneira correta na qual o mundo deve nos
conhecer, isto é, saber que estamos aqui, e que
somos algo que ele não pode compreender.
Capítulo 5 - O Significado e a Realidade das
Coisas
O livro de Apocalipse _ um livro
que revela a mudança das condições espirituais
na era pós-apostólica dos primeiros dias, e
talvez, profeticamente, o estado ao final do
tempo na igreja _ fala de certas perdas. Ele,
reprovadamente, usa as palavras: ‘primeiros’,
‘primeiro amor’, ‘primeiras obras’. Esta é
apenas outra maneira de dizer: ‘Como era no
princípio’.
Estamos, nestas reflexões,
buscando observar algumas dessas mudanças e
perdas, com vistas a criar um exercício de
recuperação.
Uma mudança posterior muito
evidente a partir do princípio, especialmente no
cristianismo ocidental, é indicada pelas duas
palavras do título desta página _ significado e
realidade.
Talvez por causa da longa
tradição e familiaridade, o nosso sistema aceito
e ordem estabelecida, ou talvez por causa de uma
apresentação excessivamente simplificada e
superficial do envolvimento, estejam num tempo e
numa condição quando o cristianismo é amplamente
uma questão de coisas sem os seus significados.
‘Conversão’ é alguma coisa menos _ se não outra
_ do que regeneração, uma nova criação. Batismo
é algo feito, ou como um ritual, o requerimento
de associação, uma submissão ao regulamento, uma
adesão a certas partes da Escritura, ou _ quando
muito _ a expressão de um desejo em seguir o
Senhor. A ‘Ceia do Senhor’, ‘A Mesa do Senhor’
está no mesmíssimo campo e tem a mesma natureza
que o batismo. A filiação à igreja, ou a uma
igreja, e o serviço cristão são coisas
previsíveis, e que são mantidas.
Quão grande é a perda do tremendo
e exigente significado dessas coisas.
Não é possível ler qualquer parte
do Novo Testamento ser ficar consciente da
preciosidade associada a qualquer passo em
relação a Jesus como o Cristo. A própria
intenção de se associar a Ele levantava as
questões mais sérias. O ato de confessar Jesus e
de se batizar envolvia dificuldades profundas e
abrangentes. Dar testemunho Dele e representá-Lo
no mundo produzia problemas espontaneamente.
Quanto mais os crentes e os servos de Cristo
avançavam, mais difícil ficava o caminho. Os
crentes, as igrejas, simplesmente tinham que
resistir e lutar por suas vidas espiritualmente.
É tão manifestadamente verdade, até mesmo em
nossos dias, que onde é mais difícil permanecer
fiel ao Senhor _ como na Alemanha Oriental,
Rússia, etc. _ lá você encontra os mais
legítimos e verdadeiros crentes. É sabido que
alguns escolheram deliberadamente retornar a
tais lugares e aceitar o sofrimento após ter
experimentado ou visto a pobreza espiritual e a
irrealidade dos cristãos nos chamados ‘países
livres’. Não é necessário ir para trás da
‘cortina de ferro’, ou para a ‘cortina de
bambu’, ou para ‘terras pagãs’, a fim de
encontrar a perseguição e, em conseqüência
disso, encontrar a realidade. Em tais casos,
milhões de cristãos no ocidente jamais
encontrariam.
Entrega total ao Senhor em
qualquer lugar irá produzir condições
espirituais que irão testar, desafiar, tornar
realidade, e extrair o significado profundo e
real de todas as coisas. Entrega total significa
disposição em permitir que o Senhor dite cada
aspecto da vida e, quando Ele se depara com uma
questão ou um teste, siga em frente, custe o que
custar. Significa estar empenhado em conhecer o
significado mais profundo e pleno de cada
pedacinho do nosso cristianismo.
O que o Espírito Santo, através
das Escrituras, quer significar com novo
nascimento, batismo, mesa do Senhor, comunhão, a
igreja, ministério e serviço, etc.? De fato, o
que significa ter o Espírito Santo? Há tanta
gente por aí se achando e tomando por certo, que
isto pode resultar em presunção _
pré-suposição. Muitos cristãos aceitam as
doutrinas, as tradições e as ordenanças, porém,
no princípio, eram as implicações, o valor e o
significado que dava realidade a tudo. Esta
realidade produzia um temor salutar. Violações
ou ignorância dos princípios vitais podem seguir
impunes em nosso tempo, e os julgamentos de Deus
não são imediatos e aparentes, mas operam
lentamente e quase imperceptíveis a longo prazo,
e conclui-se, se pensado a respeito
absolutamente, que isto não importa. Há muitas
condições e situações, confusões e frustrações,
limitações e complicações, que _ caso não
saibamos _ são julgamentos. Será que não
podemos ter levado muito longe essa
autoconfiança?
Uma coisa é muito clara: os
apóstolos e seus companheiros procuravam fazer
os crentes levarem o seu cristianismo muito a
sério, não deixando a eles qualquer dúvida das
sérias conseqüências que adviriam _ mais cedo ou
mais tarde _ caso assim não o fizessem.
Podemos tomar alguns dos assuntos
mencionados de forma mais específica e completa,
mas para o momento queremos enfatizar o
seguinte: que o Senhor jamais fez provisão para
qualquer coisa menos do que a pura realidade
Pressões serão trazidas e
colocadas sobre a nossa confissão, as quais irão
nos desmascarar, e seremos provados na moenda.
Os discípulos entenderam as implicações dos
ensinamentos do Senhor quando perguntaram:
“Senhor, são poucos os que se salvam?”
Dr. Billy Graham tem razão em
perguntar por que é que, de todos os milhares
que fazem a ‘decisão’, tão poucos continuam, e
tantos retroagem. A resposta pode muito bem ser
que as implicações totais e o significado
profundo do que representa ser um cristão não é
geralmente mostrado.
Capítulo 6 - A Grande Transição
Muito tem sido escrito, e ainda
está sendo escrito, sobre a diferença no
progresso do Evangelho nas três primeiras
décadas do cristianismo, e ao longo de todo o
tempo a partir de então. É impossível de se
negar que o progresso, então, era nada menos do
que fenomenal. Mais do que uma vez citamos as
palavras do Dr. A. M. Fairbairn: “No ano 33 A.
D., alguns pescadores galileus estavam
procurando liberdade de expressão em Jerusalém,
e foram tratados como homens pobres e
ignorantes. No ano que Paulo morreu (cerca de 30
anos mais tarde), qual era a situação? Havia
igrejas em Jerusalém, Nazaré, Cezaréia, em toda
a Síria, Antioquia, Éfeso, Galácia, Sardis,
Laodicéia, em todas as cidades da costa oeste
através da baixa Ásia, em Filipos, Tessalônica,
Atenas. Corinto, Roma, Alexandria, nas
principais cidades das ilhas e do continente
Grego, e as colônias ocidentais romanas”.
Com toda a tremenda organização,
despesa e propaganda a partir de então, e
particularmente no último século, não há nada
que se compare com aquilo, especialmente quando
é observado que naqueles primeiros anos não
lemos sobre qualquer maquinário, apelos,
delegações, exposições, demonstrações e toda
organização de missões e esforços missionários
com os quais estamos tão familiarizados hoje em
dia. Não é que haja uma falta de preocupação com
a evangelização, ou uma falta de sacrifício e
sofrimento por parte de muitos servos devotos de
Deus. Seja lá o que possamos dizer devemos nos
guardar para não depreciarmos ou desvalorizarmos
o grande derramar de vida e poder que
caracterizou o grande empenho para a salvação
das almas nesses séculos passados. Um contato
com muitos servos devotos de Deus nessas esferas
de serviço significa uma reprovação a qualquer
espírito de crítica.
Porém, reconhecendo cada
pedacinho desta devoção sacrificial, há muito
poucas pessoas que não estão cientes da
diferença mencionada acima , e volumes enormes
de literatura estão sendo publicados sobre este
assunto. Nosso objetivo não é criticar ou lançar
dúvidas, mas perguntar _ caso a comparação e
contraste for correta e verdadeira _ se há
quaisquer fatores e características que
constituem a mudança?
Houve
características no princípio as quais não são
geralmente obtidas hoje? Onde realmente
tem havido uma obra viva e efetiva para a qual
todos podem apontar como se assemelhando à obra
dos primeiros dias? E isto se deve a presença
daqueles primeiros fatores? Vamos olhar para um
ou dois exemplos notáveis e ver se eles apontam
para algo original.
Primeiramente vamos recordar a
maravilhosa e excitante história dos irmãos
moravianos. Em seus primeiros vinte anos
(somente vinte anos, observe você) eles
realmente enviaram mais missionários do que toda
a igreja protestante tinha enviado em duzentos
anos. Da entrada nos países fechados, os
sofrimentos alegremente suportados, à distância
percorridas, as vidas vividas e sacrificadas, a
graça de Deus manifestada, isto provoca
admiração e vergonha ao se ler.
Alguém disse que, se os membros
das igrejas protestantes tivessem ido em números
correspondentes, teria havido uma força
excessiva do número estimado como necessário
para evangelizar todo o mundo. Qual foi o
segredo e quais eram os fatores? Em primeiro
lugar, a cruz tinha trabalhado profundamente na
essência do ser de cada uma daquelas pessoas.
Isto teria acontecido por meio de um profundo
sofrimento. O país dessas pessoas tornou-se um
campo de sangue devido ao massacre. Elas foram
tiradas de seus lares. De uma população de três
milhões eles foram reduzidos pela perseguição
para de um milhão. De fato, pareceu algumas
vezes como que se essas pessoas tivessem sido
completamente exterminadas, e seu testemunho
extinto.
Desse fogo de aflição levantou-se
uma companhia purificada, com outro tipo de fogo
queimando em seus ossos. Era um fogo de um amor
apaixonado pelo Senhor Jesus. As reuniões desses
irmãos, quando mais tarde isto foi possível,
tinham a atmosfera da sala do cenáculo em
Jerusalém quando a tensão era similar. Pactos
foram feitos no sentido de que o ‘EU’ em
todas as suas formas deveria ser totalmente
banido: vontade própria; amor próprio; interesse
próprio, busca própria.
Ser humilde de espírito era a
busca deles, e qualquer um se entregaria a si
próprio para ser ensinado pelo Espírito Santo.
Uma vigília foi instalada a qual deveria
funcionar dia e noite, e, em revezamentos, toda
uma vinte quatro horas foi ocupada em se buscar
o Senhor. O lema era: ‘Buscar pela recompensa
dos sofrimentos do Cordeiro’. Tudo isto é o
seu próprio argumento. Uma profunda obra da cruz
trabalhada resultante de um poderoso amor pelo
Senhor Jesus. Considerações pessoais eram
perdidas e nenhuma persuasão era necessária. É
necessário provar, ou mesmo indicar, que isto
era uma real correspondência àqueles primeiros
anos do cristianismo?
Apenas para nosso primeiro
exemplo. Voltamo-nos para um outro, no qual
muito do que dissemos foi assumido com outras
características. Quão freqüentemente tem sido
apontado para a antiga história da Missão
Interior Chinesa e quanto se têm recorrido a ela
como um grande exemplo de obra verdadeiramente
de Deus em sua vida espiritual e eficiência!
Livros ainda têm sido publicados em retrospecto
com o objetivo de inspirar e restaurar por meio
daquele exemplo. Porém seria um equívoco aceitar
tudo da obra, a ‘missão’, e desprezar o
entendimento e a experiência espiritual. Com
toda a sua visão e paixão pela evangelização do
interior da China, é bem sabido que, na medida
em que o Sr. Hudson Taylor ia de um lugar para
outro com o seu coração compromissado,
discursando em reuniões cristãs, ele falava
muito pouco, comparativamente, sobre a China,
quase nada absolutamente.
Ele despejava sua mensagem
espiritual a fim de trazer o povo de Deus para
um conhecimento mais pleno do que sua união com
Cristo significava. A coisa central e suprema em
sua mensagem e com o Senhor era a sua ênfase
sobre A EFICÁCIA UNIVERSAL DA ORAÇÃO. Ouçam-no:
“No estudo da Palavra divina aprendi que, para
se obter trabalhadores de sucesso, não adiantam
apelos elaborados, mas oração sincera a Deus...
e o desejo ardente pela vida espiritual da
igreja, de modo que os homens pudessem ser
incapazes de permanecer em suas casas, isto era
o que se necessitava”.
Se fôssemos colocar o íntimo
daquela obra _ a experiência espiritual original
_ em poucas palavras, teria que dizer que ela
não foi fruto de organização, proteção, apelos,
ou propaganda, mas de um homem com um profundo
conhecimento de Deus, nascido de uma profunda
obra da cruz em seu íntimo, com uma mensagem
espiritual viva para o povo do Senhor, em
relação a sua vida plena Nele, e a
exteriorização prática de tal vida através da
oração.
Sr. Hudson Taylor não se
posiciona ao lado de proeminentes professores
de Bíblia, no sentido de apresentar a verdade
numa forma sistematizada. Ele não era um dos
muitos distintos mestres da Bíblia no sentido
geralmente aceito desse termo em sua geração. A
sua mensagem levava imediatamente a duas
questões. Primeira, o relacionamento do crente
com o Senhor e, então, a exteriorização prática
desse relacionamento em oração e outras formas
de serviço; levar o evangelho para aquelas
pessoas que não tinham oportunidade de
recebê-la, exceto por meio de um dedicado
esforço de alcançá-las. A vida do Sr. Hudson
Taylor voltou-se para um ponto específico sobre
uma compreensão mais profunda do que aquela
união com o Senhor realmente significa. Em nosso
último capítulo, referimo-nos a íntima ligação
entre o movimento de convenção, tal como
‘Keswick’ e a evangelização mundial. Em relação
a isso poderíamos apontar para os ricos
ministérios espirituais de tais servos de Deus
como Dr. Andrew Murray e Sr. Charles Inwood,
através dos quais ministérios fortes e
frutíferas missões evangelísticas aconteceram.
De que forma, então, isto tem
conexão com aqueles primeiros anos do
cristianismo? A resposta seguramente é
encontrada numa correta compreensão do
significado do Pentecostes. O que foi o
Pentecostes? Temos lamentavelmente falhado em
responder correta e adequadamente esta questão.
Os efeitos cumulativos e externos têm
obscurecido os elementos mais profundos. Temos
interpretado o Pentecostes em termos de
atividade, sinais, ondas de emoção,
excitabilidade, línguas, curas, etc.
Havia algo que explicava todas as
manifestações e era mais do que essas. Era _ A
ENTRONIZAÇÃO DO SENHOR JESUS COMO ABSOLUTO
SOBERANO, sem qualquer reserva ou ordem
antagônica sobre e dentro da vida inteira, em
todos os seus interesses e atividades de homens
e mulheres comprometidos! Aquilo que tinha
acontecido na própria Pessoa do Senhor Jesus foi
tornado real pelo Espírito Santo na igreja em
sua origem. Esta exaltação significava que Jesus
tinha libertado. O livro que conhecemos como
Atos dos apóstolos poderia muito bem ser chamado
de a Soltura do Senhor.
Até o tempo de Sua morte, Jesus
tinha estado severamente limitado. Ele próprio
disse isso. Sua declaração em relação a isto
foi: “Eu vim para lançar fogo sobre a terra;
e que mais quero, se já está aceso? Importa,
porém, que seja batizado com certo batismo; e
como me angustio até que venha a cumprir-se!”
(Lucas 12:49,50). (“me angustio” aqui significa
“sob pressão e estresse). Seu espírito desejava
por libertação; tensão contra as limitações de
sua atual posição. A encarnação, em natureza e
propósito, significava limitação física e
geográfica. Significava limitação nacional.
Significava limitações nos homens a quem Ele
havia escolhido; a presente falta de
inteligência e compreensão espiritual deles; a
incapacidade deles de entender a natureza da
nova dispensação que Ele tinha inaugurado; a
ligação terrena deles; o interesse e a ambição
própria deles; a vaidade, a positividade e os
julgamentos naturais deles.
Então, a terrível limitação do
não cumprimento da lei em Israel, o predomínio
do legalismo, esmagando e aprisionando as almas
daqueles que estavam debaixo de seu poder que
tirava o descanso. “O”, Ele clamava, “que o
batismo (da paixão) estivesse consumado, para
que Eu, e eles, pudéssemos ficar livres.” Esta
libertação veio através da morte e da
ressurreição _ ascensão. Após a paixão Ele não
mais estava sujeito aos limites físicos,
geográficos, nacionais e naturais; Ele estava
emancipado e livre. Universalidade era a nova
ordem, e a “terra podia conhecer o fogo
dispersador”. Ele tinha a resposta limitada e
restrita de seus homens, não mais por meio de
persuasão e comando exterior. Agora por meio de
uma iluminação e de um dinamismo interior eles
também estavam livres de suas cadeias e
prisões.
Não mais medo, mas coragem! Não
mais vergonha, mas glória! Não mais defesa
própria, mas disposição para sofrer, mesmo a
morte por causa de Seu nome! Num golpe
estratégico Ele tocou os homens ‘de cada nação
debaixo do céu’ em Jerusalém num só dia. Que
história resulta desta libertação! Como o fogo
se espalhou! A libertação do Senhor significou a
liberação do Espírito Santo, e a liberação do
Espírito Santo efetivou a libertação da igreja.
Por isso duas coisas surgem para serem
consideradas e exercitadas. Primeira, uma nova
compreensão da libertação através da morte; isto
é, o que realmente significa a cruz na
libertação da Igreja; e segunda coisa, qual é a
real natureza da atual posição de Cristo. É aqui
que a cristandade tem falhado, onde a igreja no
princípio se ergueu. Essas duas coisas serão os
nossos focos no próximo capítulo. É aqui que,
indubitavelmente, tem que haver um movimento
espiritual de regresso, a fim de se recuperar a
eficácia e o poder.
Que todos os elementos de uma
grande transição estavam presentes naqueles
primeiros anos seguintes à ressurreição e
ascensão do Senhor, e ao advento do Espírito
Santo, é indiscutível. Embora aquelas pessoas
imediatamente envolvidas e em responsabilidade
não estivessem totalmente cônscias quanto ao
significado daquilo que estava acontecendo, e
fossem vagarosos em compreender as implicações
das coisas, não há qualquer dúvida de que elas
estavam conscientes de estarem sendo lançadas
para dentro de águas desconhecidas, profundas e
não familiares. Coisas estranhas estavam
acontecendo, e o significado mais amplo apenas
vagarosamente ia sendo revelado a elas. Verdade,
houve atos da Divina Soberania que não poderiam
ser ignorados, porém seus significados mais
amplos apenas ia crescendo neles. Por exemplo, a
morte de Estevão foi um evento, porém, aquilo
que Estevão e a sua morte implicavam parece que
apenas foi reconhecido com o decorrer do tempo.
Foi necessária a “prisão” de Paulo por Cristo, e
o pleno propósito de sua eleição para se
explicar sobre Estevão.
“A perseguição que se levantou
por causa de Estevão” estava sob o controle
soberano do céu, mas parece que se tem olhado
para isto somente sob esta ótica, e não como uma
parte do plano dispensacional. Havia um apego a
Jerusalém.
Dr. Campbell Morgan tem um ótimo
parágrafo sobre este assunto em seu livro “Atos
dos Apóstolos”. Está escrito assim: “O martírio
de Estevão criou uma crise na história da
igreja. Ao ler Atos, descobrimos que, a partir
deste ponto em diante (capítulo oito), Jerusalém
não mais é o centro do interesse. Ela quase
desaparece das páginas. Isto não é uma perda,
mas um grande ganho. Quando Jerusalém cessa em
ser o centro do interesse, a história não é
prejudicada de forma alguma, nem é o reflexo de
Jerusalém. O local, o temporal, o material, são
de pouca importância na Igreja de Deus. O
universal, o eterno, o espiritual são supremos.
Era do próprio espírito de uma economia velha e
passada o apegar-se a um centro geográfico, a
depender de símbolos materiais. A igreja agora
se move para fora sobre o grande caminho de seu
negócio vitorioso, independente de Jerusalém.
Esta é a suprema revelação do livro de Atos dos
apóstolos. Não foi de forma fácil que eles
aprenderam esta lição, pois os apóstolos se
apegavam a Jerusalém; porém o grande movimento
espiritual, independente de Jerusalém, e dos
apóstolos, seguiu adiante, sem desprezar
Jerusalém, sem desconsiderá-la, sem ficar
indiferente à sua história e contribuição
inicial, porém bem mais influenciado pela visão
da Jerusalém do alto, a mãe de todas… Não mais
restrito por localidades e temporalidades, o
aumento da vida espiritual da Igreja os
impulsionou por todos os lugares.
O fracasso da igreja tem
invariavelmente se originado de um esforço de
reprimir esse movimento espiritual que é
independente da localidade, e de todas as coisas
materiais. Sempre que a igreja é governada a
partir de Jerusalém, ou de Roma, ou de qualquer
outro lugar que não do céu, ela é obstruída,
dificultada e impedida de desempenhar as grandes
funções de sua existência. Primeiro, quando
estamos presos a eventos e acontecimentos, nós
somente os vemos neles mesmos: o elemento de
perspectiva e origem é obscurecido e ofuscado.
As coisas em si mesmas são tudo o
que vemos. Nós, em tempos posteriores, somos
capazes de compreender como os passos e
incidentes se encaixaram no propósito Divino.
Ou, somos nós tão capazes? Talvez a incapacidade
de assim discernir seja a razão para tanta
confusão quando o modelo está diante de nós.
Então, segundo, eles eram, assim,
vagarosos porque a maneira de Deus ensinar é
mais por experiência do que pela teoria.
Geralmente eles tiravam suas conclusões a partir
de fatos consumados e não por meio de teorias
racionalizadas. Deus fazia algo e explicava
depois. Isto é algo que pode ser útil a todos
nós em eventos que, no momento, estão fora de
nossa compreensão. O céu tem o seu propósito, e
aquilo que não é explicado hoje ficará claro
mais tarde.
Qual foi, então, a grande
transição? Foi a passagem de todo governo da
terra para o céu; das mãos do homem para as mãos
de Cristo Exaltado. Doravante toda referência e
deferência eram para o Filho de Deus exaltado. A
partir de então o homem era um mero instrumento,
um veículo, um recipiente. O homem não era um
originador, um idealizador, uma fonte, um
inventor, um planejador, um mestre. Ele tinha
que obter tudo, estar absolutamente sujeito.
Existe uma crença muito indefinida e nebulosa
sobre a soberania de Deus. É um tipo de uma
generalização fatalista que toma tudo em suas
próprias mãos, e ‘confia em Deus que tudo sairá
bem’.
Não era assim no princípio. A
oração era feita em relação a cada questão, e
eles não se moviam até que pudessem dizer com
segurança: “Pareceu bem ao Espírito Santo e a
nós”, ou “O Espírito Santo disse…”.
São coisas muito raras de serem ditas pela
igreja hoje. A custódia do Espírito Santo em
relação a missão mundial da Igreja, local e
universal, não foi assumida na incerteza, mas
uma referência específica e definida a Ele foi
feita. Porém, quando indicamos o fato e a
natureza genérica da grande transição, somos
obrigados a dizer algo quanto a grande
dificuldade na qual ela envolveu a nova
dispensação. Esta provavelmente foi outra razão
por que, por um lado, a mudança se deu de forma
tão vagarosa, por outro lado, por que o Senhor
não a impôs sobre eles de forma imediata.
Parece que o Senhor os nutriu
dentro dessa transição com certas precipitações
de crise. A mudança foi, assim, radical! A nova
posição de fato era muito nova. Apenas como
ilustração, considere Israel no deserto. Sob
duro teste, eles podem mais tarde ter dado ao
Egito um adorno ilusório e sublime, quando
desejaram ardentemente pelas “panelas de carne
do Egito”, pelos alhos e cebolas, porém ainda
havia panelas de carne! Eles olharam as suas
‘amassadeiras’, então devia ter havido farinha
para amassar, e a referência freqüente a
fermento indica pão saboroso.
Subjugados, oprimidos, e em
escravidão como tinham estado no Egito, a
subsistência deles era tangível e certa. O
deserto era uma nova posição e um teste extremo.
A vida foi colocada sobre uma base sobrenatural
em todas as questões temporais. Se isto foi
verdade a respeito de um Israel terreno, quanto
mais do celestial!
Nesta nova dispensação todas as
nossas bênçãos espirituais estão nos lugares
celestiais. Nossa cidade e cidadania estão no
céu. Nosso Sacerdote, e altar, e sacrifício
estão no céu. Nosso chamado é um chamado
celestial. Toda a nossa subsistência espiritual
tem que vir do céu. Somente aqueles que estão
completamente comprometidos com Deus sabem como
esta vida pela fé é uma prova. E ainda, que
milagre é o fato de ainda continuarmos
caminhando, e não termos naufragados, mesmo após
tantos anos de provas e sofrimentos! Nossa
posição de modo algum é uma posição fácil. Ela é
tão contrária à vida natural e da carne! Mas ela
prossegue pelo poder da ressurreição.
Podemos acrescentar que, quanto
mais longe formos com o Senhor _ não meramente
em questão de tempo, mas em profundidade _ mais
provada a nossa posição se tornará. É impossível
tomar uma posição com Deus sem ter esta posição
provada severamente e, talvez, repetidamente.
Pode ser pensado que caminhar com Deus irá
implicar Sua proteção contra as sérias provas e
adversidades. Na verdade a coisa funciona de
outra maneira, mas Ele sustenta e é fiel. A
justificação será encontrada nos valores
espirituais, celestiais e eternos. Em virtude de
muitos não terem tido a medida espiritual para
se manterem numa posição mentalmente,
doutrinariamente ou objetivamente assumida, eles
retrocedem para uma posição mais ‘simples’, ou
mais ‘prática’, e isto explica a muita fraqueza
entre os cristãos em nossos dias.
Sem dúvida alguma, o Espírito de
Deus está pressionando muitos cristãos para esta
realidade. Isto é verdade, até mesmo no meio de
tanto esforço para popularizar o cristianismo e
para eliminar o duro caminho da cruz. Alguns
podem precisar de golpes duros a fim de largar a
estabilidade tradicional, mas isto apenas faria
o fim da era corresponder a do princípio, tanto
no método do Espírito quanto em Seu objetivo.
Sistemas terão que entrar em colapso a fim de
que a Pessoa seja tudo em todos. Quando dissemos
isto, tocamos um ponto no qual as coisas diferem
radicalmente no cristianismo organizado da forma
como eram no princípio. A organização geralmente
remove a oportunidade de se provar Deus e de Lhe
dar toda glória.
Capítulo 7 - A Cruz
Quando nos referimos ao
“princípio” _ significando o princípio do
cristianismo _ naturalmente, instintivamente
pensamos no Pentecostes, aquele advento do
Espírito Santo. Nós, então, passamos a pensar
sobre o registro dos “Atos” do Espírito Santo.
Para um retorno, ou uma recuperação de tal
condição há freqüentemente um desejo expresso,
até mesmo um desejo ardente, e em muitos
aspectos básicos também. Nós aqui estamos
procurando sublinhar alguns desses fatores
fundamentais. Assim, vamos agora apontar para
aquele que é vital e importante para todo o
cristianismo do Novo Testamento.
Doutrinariamente isto poderia levantar um pouco
de controvérsia entre os evangélicos, mas a
própria aceitação da doutrina naturalmente pode
significar um reconhecimento inadequado de sua
necessidade crucial. Podemos apenas confiar que,
na medida em que prosseguirmos, um novo
reconhecimento da grandeza e imperiosidade desta
verdade possa trazer luz aos leitores.
Esta grande verdade é que:
a) - O Espírito Santo tem uma
corte de apelo da qual, em hipótese alguma, irá
renunciar.
O Espírito Santo possui um
Árbitro, um Juiz a quem constantemente irá
apelar por um veredicto sobre cada questão. Como
num jogo ou disputa entre dois lados opostos o
apelo é feito ao árbitro; ou, como num tribunal,
o apelo é feito ao magistrado: assim é com o
Espírito Santo. Ele tem uma base firme para o
Seu veredicto, e o Seu veredicto é definitivo
quanto a morte ou a vida, quanto a rejeição ou
aceitação. É de importância suprema que o
Espírito Santo diga ‘sim’ ou ‘não’. Percorra o
livro de Atos e observe onde e quando este
veredicto foi dado, de uma forma ou de outra, e
veja o resultado. Havia uma sensibilidade ao
Espírito Santo, então, que levava tudo para a
prisão ou libertação, ao se descobrir se o Seu
dedo indicava ’sim’ ou ’não’.
Qual era a base de arbitramento,
julgamento e veredicto do Espírito Santo? Era
sempre a cruz. A cruz, combinando a morte e a
ressurreição de Cristo, era o supremo e
categórico ‘sim’ ou ‘não’ de Deus. A morte de
Cristo foi aquele eterno ‘não’ a uma inteira
ordem e fonte de coisas. A ressurreição foi o
Seu maravilhoso e glorioso ‘sim’ a uma outra
ordem.
b) - O Espírito Santo sempre apelou para a Cruz
Isto é visto _ se pudermos
enxergar _ em toda parte no Novo Testamento.
Considere o fato de que a cruz pôs fim a uma
humanidade inteira em Adão e deu o único lugar
para o outro “Adão”, uma nova e diferente
humanidade, e depois vá através de cada livro do
Novo Testamento. Freqüentemente, muito
freqüentemente, você irá encontrar a cruz
definitivamente mencionada de alguma forma, tal
como “A Cruz de nosso Senhor Jesus”, ou “Cristo
Crucificado”, etc. Algumas vezes isto se dará
por implicação, tal como em Filipenses 2.5-8.
Algumas vezes uma exortação, uma ordem, uma
admoestação, um apelo, irá envolver a cruz para
uma resposta. A cruz governa ao longo de todo o
caminho, e ela possui muitas e grandes
aplicações e conexões. Em todas as questões da
vida, conduta, serviço, movimento, espírito,
fala, julgamento, etc..., é como se o Espírito
Santo estivesse dizendo: “Isto foi crucificado
com Cristo”; “Isto pertence a uma fonte que foi
sepultada com Cristo”. Ou, pelo contrário: “Isto
tem o Meu veredicto de vida e paz porque
‘ressuscitou com Cristo’; possui o ‘SIM’ de
Deus”.
Em Corinto havia tanta
carnalidade que a sensibilidade ao julgamento do
Espírito Santo estava endurecida ou limitada.
Por isso o apóstolo _ antes de ter vindo a eles
_ tomou uma resolução positiva de ‘não saber
nada entre eles, a não ser Jesus Cristo, e este
CRUCIFICADO’. “Cristo crucificado _ a sabedoria
de Deus e o poder de Deus”. “Nós pregamos Cristo
crucificado”.
Isto é um exemplo do que queremos
significar quando dizemos que o arbítrio, o
julgamento do Espírito Santo é sempre em relação
a cruz. Isto pode ser notado em sua conexão
múltipla e específica em todos os demais livros.
A violação desta posição invariavelmente
resultava em confusão, complicações, e
frustração. Havia lapsos, e os atos soberanos de
Deus solucionavam completamente a situação,
porém o registro deixa esses lapsos como avisos
para todos os tempos.
Não podemos relegar a cruz à
história, como um evento, um pedaço de doutrina
cristã. Ela é um julgamento permanente; o
Cordeiro está no trono, e haverá um veredicto
final. A última visão é “do Cordeiro no meio do
trono”, e o cenário completo será o do eterno e
supremo ‘sim’ de Deus, quando tudo o que
pertence ao ‘NÃO DE DEUS’ será efetivamente
removido .
Vamos com o Espírito Santo para a
cruz com todos os nossos assuntos, e peçamos a
Ele que dê o Seu veredicto a respeito, se tal
assunto é vida ou se é morte diante de Deus.
Capítulo 8 - Libertação por Iluminação
Nesta busca pelos segredos do
poder e efetividade como ponto distintivo de
coisas neste livro de “Atos”, estamos vendo que
esses segredos são tão grandemente encontrados
no que aconteceu aos próprios apóstolos, e não
num sistema completo de ensino, prática ou ordem
em forma de relatório. É ainda quase impossível
saber exatamente como eles conduziam as suas
reuniões. Há certas características mencionadas,
e diversos detalhes apresentados quanto às
coisas que aconteciam, porém, muita coisa era
simplesmente espontânea, sem qualquer arranjo.
Há conhecimento suficiente para fazer uma
correspondência contemporânea tão revolucionária
de maneira a desconcertar muito das nossas
formas, aceitações e procedimentos usuais. Por
exemplo, a nossa forma atual da “Santa Ceia” ou
“Mesa do Senhor” possui muito pouca semelhança
com a do Novo Testamento, e as reuniões da
igreja local eram quase que inteiramente
diferentes das nossas reuniões. À parte de
muitos fatores e características básicas, mesmo
aquelas mais genéricas, como batismo e o fato de
partir o pão, não há nenhum modelo rigidamente
especificado no Novo Testamento. É, portanto,
uma falsa esperança e esforço vão tentar
‘formar’ “Igrejas Neotestamentárias Perfeitas”.
Isto não significa que não haja princípios
espirituais muito definidos os quais, se
realmente prevalecerem, irão produzir o poder e
a efetividade daqueles primeiros tempos. É a
fim de descobrir isto que estamos nos lançando
nessas considerações.
O princípio espiritual ao qual
iremos agora dar atenção é um sobre o qual
existe a maior controvérsia e oposição. Isto é
normalmente verdade no caso das questões de
grande importância, e estamos convencidos de que
esta matéria agora diante de nós é de fato da
máxima importância. É o que iremos chamar de:
Libertação por Iluminação.
Em relação a isto devemos começar
com o que aconteceu aos apóstolos no dia de
Pentecostes.
É muito claro a qualquer um que,
apesar de todo o ensino e explanação dada
pessoalmente por Jesus aos seus discípulos, eles
não O compreenderam, como também não
compreenderam as Suas Escrituras. Até mesmo
quando Ele deu a dois deles aquilo que devia ter
sido um magistral e incomparável discurso sobre
a chave para todas as Escrituras, de Moisés em
diante, e por um momento, “abriu suas mentes,
a fim de que pudessem compreender as Escrituras”,
é evidente que a “raiz da questão” não estava
dentro deles. Foi como uma iluminação
transitória dada a Pedro, quanto a Pessoa de
Cristo, da qual Jesus disse que não tinha sido
carne nem sangue quem revelara aquilo a ele, mas
o Seu Pai celeste. A iluminação transitória não
salvou Pedro da coisa mais terrível e trágica
que um homem poderia fazer: negar o conhecimento
de Jesus com raiva e veemência. Não, até o
sepultamento de Jesus e pelos quarenta dias
posteriores, as Escrituras era um livro
completamente fechado para eles.
Porém, olhe e ouça no dia de
Pentecoste! Pedro e os onze passam a gozar de
uma Escritura aberta; as Escrituras são
vivificadas. Olhe para as referências, citações
e interpretações. A Bíblia estava completamente
viva e estava compungindo os corações dos
homens, fazendo-os clamar.
O livro fechado significava
homens amarrados e aprisionados. A iluminação
espiritual foi a libertação deles. O Senhor foi
liberado a eles pelo Espírito Santo e, a partir
de então, eles se tornaram homens livres.
Até aqui ninguém irá levantar
qualquer objeção. Porém temos que ir mais
adiante. O que temos como sendo nosso Novo
Testamento é o produto da continuação daquela
iluminação. Quão felizes nós cristãos devemos
ficar por nosso cristianismo não ser um tratado
ou manual de assuntos religiosos, discursos
sobre filosofia da religião ou doutrina, mas ser
a verdade Divina revelada, a fim de satisfazer
as situações cruciais que surgem na vida real. É
luz dada pelo Espírito de Deus no meio da
batalha, da adversidade e da absoluta
necessidade. É história espiritual produzida
sobre a bigorna de profunda experiência. O Novo
Testamento é a revelação dada em contraste com
situações e condições que precisam de nada menos
do que uma completa salvação, uma questão de
vida ou morte. Não é um volume de teorias
abstratas, mas de luz celeste para libertar
almas. Portanto, o seu valor é prático, e não
teórico; é vital, e não estático; é fundamental,
e não opcional.
Até aqui tudo bem. Porém agora
chegamos a um ponto vital:
Vamos nos apressar para dizer muito enfático e
categoricamente que, como uma revelação divina
em substância e instrumental, a Bíblia está
fechada e completa. Não há nada a acrescentar a
ela em substância e conteúdo. Deus não irá dar
mais nenhuma Escritura, do mesmo modo não irá
dar nenhum Cristo extra. Ao dar o Seu Filho, Ele
deu tudo Nele! Com as Escrituras Ele deu TUDO em
conteúdo.
Porém, quando dissemos isto
podemos ficar apenas com o Novo Testamento, como
ficavam os discípulos com o Velho Testamento.
Podemos ter a carta, o livro, o registro, e
mesmo assim não ter o significado. A obra do
Espírito Santo era dupla em relação a isto.
Primeiramente dar a substância e o selo como
definitivo a este respeito. Segundo, revelar ou
iluminar o que está na substância. O primeiro
alcançou o seu auge e finalidade quando o último
apóstolo deixou esta terra. O segundo continua.
O Novo Testamento usa duas palavras nesta
questão. Ele fala de ‘conhecimento’ (i.e
de Cristo) e também fala de ‘pleno
conhecimento’ (‘Dele’). Um é por meio da
abertura inicial dos olhos; o outro é pela
iluminação contínua. Por isso o apóstolo Paulo
orava pelos crentes para que “Ele vos dê
espírito de sabedoria e de revelação no pleno
conhecimento Dele, tendo iluminado os olhos do
vosso entendimento” (Efésios 1.17,18). É por
meio dessa iluminação que a vida é mantida, que
o crescimento é assegurado, e que a libertação é
feita.
Os discípulos, no dia de
Pentecoste, se tornaram homens emancipados, e
uma marca de sua emancipação foi a vivificação
das Escrituras pela iluminação dada pelo
Espírito Santo. Mas isto não parou aí. Veja o
discurso de Estevão. Veja o discurso de Pedro,
no episodio de Cornélio. Veja Filipe e o etíope,
e assim por diante. Esta não é uma reivindicação
para que uma revelação extra e especial seja
adicionada às Escrituras, mas é uma declaração
de que ‘o Senhor tem ainda mais luz e verdade
para fazer brotar de Sua palavra’.
Sobre esta matéria, ouça o que um
respeitado e aceito servo do Senhor tem a dizer:
“A semente interior da verdade
tem a mesma substância que a casca. A mente
consegue entender a casca, mas somente o
Espírito de Deus pode entender a essência. Nosso
grande erro tem sido este: temos confiado na
casca, e crido que estamos sãos na fé porque
somos capazes de explicar a forma exterior da
verdade, como encontrada na Palavra. A partir
deste erro mortal, o fundamentalismo está
morrendo lentamente. Temos esquecido de que a
essência da verdade espiritual não pode chegar a
alguém que conhece a face externa da verdade a
menos que primeiro haja um milagre do Espírito
dentro do coração” (A.W. Tozer em ‘A Divina
Conquista’).
Muitos servos de Deus tiveram
toda a sua vida e ministério revolucionados e
libertos _ como os apóstolos _ por meio da
iluminação dada pelo Espírito Santo para
entender a Palavra de Deus, a qual tinha estado
a muito tempo em suas mãos, muito familiar
quanto a sua linguagem e substância. Este é
certamente um dos segredos do poder e da
efetividade de vida e pregação “Como Era No
Princípio”. As mesmas Escrituras podem ser
usadas por dois pregadores ou ensinadores
distintos, com resultados diferentes. O primeiro
pregador, com um céu aberto e ministrando na
unção pela iluminação espiritual em seu próprio
espírito, traz um impacto celestial onde a vida
é comunicada. O outro, com apenas uma
compreensão mental, estudada e mais ou menos
inteligente, porém espiritualmente improdutiva,
deixa o coração vazio.
Até aqui, nesta conexão
específica, temos apenas fatos declarados. Não
podemos ser tão fortes nesta declaração. Ainda
restam duas coisas a serem feitas. A primeira é
que o povo do Senhor, especialmente os seus
servos, deve perceber que o dom do Espírito
Santo (que é para TODOS os recém-nascidos) é
definitivamente para iluminação, ou, como dizem
os apóstolos _ “Espírito de... Revelação”; para
revelar, interpretar, e para guiar a “toda
verdade”. João faz disto um ponto muito
decisivo, quando fala de “a Unção que
recebestes”. Ele fala que “a Unção vos ensina
todas as coisas”. Todos os crentes devem se
beneficiar de novos olhos e nova visão como uma
parte integrante de seu novo nascimento. Esta
faculdade de visão e compreensão espiritual deve
crescer em força e profundidade por toda a vida.
Não é algo extra; é o desenvolvimento de uma
capacidade dada no novo nascimento.
Contudo, pode haver certa
necessidade, até mesmo uma crise, que resulte na
liberação do Espírito, e na libertação do
discípulo. Deve ser reconhecido que o ministério
dos apóstolos, principalmente para os crentes,
tinha esta iluminação e compreensão espiritual
como sua força motriz, o que significa que até
mesmo crentes verdadeiros podem estar limitados
nesta questão. Vamos, no entanto, tomar esta
iluminação espiritual como direito de
nascimento, e ter um exercício definido a
respeito disto diante do Senhor.
FIM
*A
tradução deste estudo foi feita voluntariamente por Valdinei N. da
Silva, que, por reconhecer a excelência do conteúdo, coloca o mesmo ao alcance da Igreja de
Cristo, para sua edificação. Peço aos irmãos que possuírem
conhecimentos mais aprofundados em tradução, que colaborem, enviando as
suas preciosas observações e retificações para:
valdineibr@gmail.com
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